A produção do ambiente construído tem demandado um grande aporte de energia e de materiais, provocando graves desequilíbrios ambientais e a deterioração da qualidade de vida das populações humanas, principalmente nos países em desenvolvimento. Verifica-se atualmente que os recursos energéticos e as matérias primas naturais tornaram-se fatores limitantes para o progresso econômico-social, mas, mais do que isso, a exploração desses insumos e os impactos resultantes do seu consumo podem comprometer o desenvolvimento.
No caso brasileiro, a pobreza foi diretamente relacionada aos problemas ambientais (COMISSÃO, 1991), sendo que sua manifestação mais visível é a condição da habitação. A extensão do déficit habitacional nacional, que vem apresentando uma evolução crescente nas últimas décadas, atingindo principalmente os grandes centros urbanos, indica que a abordagem setorial comumente empregada precisa ser superada para possibilitar avanços efetivos com vistas à melhoria da qualidade do ambiente construído. No entanto, a abordagem de integração a partir da visão do processo produtivo como um todo raramente tem sido feita.
Em geral, os procedimentos convencionais da construção civil no país não consideram os impactos das atividades do setor sobre o meio ambiente, seja natural ou construído. Entretanto, é preciso adotar critérios para a tomada de decisões a partir de uma perspectiva integrada e sustentável durante todo o processo de produção das edificações. A adoção de tais critérios resulta no projeto de edificações de melhor qualidade, racionaliza o uso de recursos naturais (energia e materiais) e evita o desperdício de recursos humanos e materiais durante a construção. Esse tipo de resultado é particularmente importante no caso da habitação de interesse social, tendo em vista que as muitas avaliações já realizadas no país apontam falhas em todos esses quesitos, notadamente quanto ao conforto ambiental (veja, por exemplo, o amplo estudo sobre o assunto de ROMERO e ORNSTEIN, 2003).
As edificações no Brasil são responsáveis por cerca de 16% do consumo total da energia produzida no país e 44% do consumo total de energia elétrica, considerando-se os setores residencial, comercial e institucional (BRASIL, 2005). Grande parte dessa energia é consumida na geração de conforto aos usuários. A maioria das edificações desperdiça energia e aumenta seus custos operacionais por não considerar, desde o projeto arquitetônico, sua construção até a utilização final, os critérios de desempenho e de produção construtiva derivados da dimensão bioclimática em arquitetura, bem como materiais, equipamentos e tecnologia construtiva vinculados à eficiência energética.
Do percentual apontado de consumo energético, 22%, ou seja, a metade corresponde ao setor residencial. Nesse setor, apesar de haver uma grande variedade de tipologias de edificações e de padrões socioeconômicos, uma pesquisa anterior à crise do setor energético brasileiro de 2001 mostrava, com relação ao consumo desagregado por usos finais, que os maiores gastos estavam ligados à refrigeração, ou seja, ao uso de equipamentos como geladeira e freezer (JANNUZZI e SCHIPPER, 1991) como mostra a figura 1.
Figura 1 – Consumo energético desagregado por usos finais no setor residencial brasileiro
Fonte: Adaptado de Jannuzzi e Schipper (1991).
Com a grande melhoria de desempenho observada nos equipamentos eletrodomésticos do país nos últimos anos, bem como com a utilização de lâmpadas mais eficientes depois da crise de 2001, observou-se uma tendência à mudança nesse quadro, como mostra a figura 2, passando os maiores gastos de energia a se concentrarem no aquecimento de água (PEREIRA, 2002).
Ora, o gasto energético para o aquecimento de água no setor residencial brasileiro está tradicionalmente ligado ao uso do chuveiro elétrico, um equipamento que impacta fortemente a curva de carga das concessionárias de energia no Brasil. Há, pois, um grande interesse na diversificação da matriz energética do setor residencial, como forma de diminuir o risco de desabastecimento de energia elétrica, bem como de dar melhor uso à energia produzida, direcionando-a aos setores produtivos da economia.
De fato, segundo estimativas do Grupo de Estudos em Energia, para fazer face ao déficit habitacional brasileiro, estimado, em 1996, em 5,4 milhões de moradias (GONÇALVES, 1998), seria necessário um aumento da oferta de energia correspondente a pelo menos 48% da potência instalada em Itaipu, considerando os padrões atuais de consumo de energia no setor residencial com o uso intensivo do chuveiro elétrico. Isso seria inviável através da geração hidrelétrica, cujo potencial de aproveitamento encontra-se praticamente esgotado no país – o que já justificava, desde aquela época, a necessidade de estudos para a diversificação da matriz energética do setor. Mas essa situação é muito mais grave, pois, segundo a Fundação João Pinheiro (MINAS GERAIS, 2001), o déficit habitacional brasileiro, na verdade, está evoluindo, passando para 6,65 milhões de unidades em 2000, sendo que as famílias com renda de até 3 salários mínimos são as mais violentamente atingidas, compondo 83,2% do déficit nacional.
Esse quadro mostra a necessidade de desenvolvimento de estudos para a inovação tecnológica no setor, principalmente aqueles voltados para viabilizar soluções para as famílias com renda de até 3 salários mínimos. Nesse caso, um dos principais problemas não é apenas o de oferta de moradia a um custo compatível com a renda dessas famílias, mas o de viabilizar o acesso delas à infra-estrutura de abastecimento de energia e água, fixando estas famílias e diminuindo a proliferação de assentamentos precários, como favelas.
Fonte:
ASSIS, et al. Habitação social e eficiência energética: um protótipo para o clima de belo horizonte. In: Anais do II Congresso Brasileiro de Eficiência Energética - IICBEE. Todos os direitos reservados ABEE. Vitória (ES). 2007.
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